sábado, 9 de dezembro de 2023

Leitura ecumênica de "O Verbo" (João)

Deste post em diante devo trazer visões ecumênicas (dentro dos limites das religiões e filosofias que conheço) sobre os evangelhos de João, Lucas, Marcos e Mateus. Talvez eu também traga um pouco dos textos atribuídos a Tomé e Felipe nos próximos meses.

O Verbo (João 1: 1-18) 

"No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. 

Ele estava no princípio com Deus. 

Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. 

Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. 

E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam. 

Houve um homem enviado de Deus, cujo nome era João (o Batista). 

Este veio para testemunho, para que testificasse da luz, para que todos cressem por ele. 

Não era ele a luz, mas para que testificasse da luz. 

Ali estava a luz verdadeira, que ilumina a todo o homem que vem ao mundo. 

Estava no mundo, e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. 

 Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. 

Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome; 

Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. 

E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade. 

João testificou dele, e clamou, dizendo: Este era aquele de quem eu dizia: O que vem após mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu. 

E todos nós recebemos também da sua plenitude, e graça por graça. 

Porque a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. 

Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou."

Certamente, desde o século 1 até este início de século 21, textos como este são considerados místicos, ou com forte teor místico. Isto porque falar sobre a criação do universo (a origem de tudo) ou sobre o Criador é falar do transcendente, ou seja, é falar do que vai além do que a maioria das pessoas neste início do século 21 ainda entendem por tempo e espaço. O tema toca a questão da Trindade e outros assuntos, todos misteriosos e difíceis de decifrar, justamente pelo fato de tratar do que está além da vida corpórea / sensorial, ou seja, o transcendente. 

A Kriya Yoga relaciona este trecho de João com Apocalipse 3:14: “Estas coisas diz o Amém, a testemunha verdadeira, o princípio da criação de Deus”. O “Om” dos Vedas veio a ser a palavra sagrada Hum dos tibetanos, Amin dos muçulmanos e Amém dos egípcios, gregos, romanos, judeus e cristãos. Em hebraico, seu significado é seguro, fiel. 

João trata da origem de Cristo como espírito, não apenas do Jesus encarnado em Nazaré. Assim, entende-se que Cristo é o espírito mais elevado e uno com Deus, pois estava (existe) desde o momento da criação do mundo (Terra) e possivelmente desde a criação do universo também. 

Existem diferentes visões sobre Jesus: desde as religiões tradicionais que explicam que ele é Deus até leituras meramente históricas que o tratam como um ser humano normal. Independentemente de propagar certezas, é bom evitar extremos, pois são visões mais reducionistas que tendem a dar abertura a conflitos e discórdia. Além disto, as diferentes religiões e espiritualidades podem conjecturar diferentes níveis de seres entre a Terra e Deus, sejam eles espíritos, anjos, devas ou daemons.

Porém teorizar uma hierarquia espiritual que o ser humano em sua vida corpórea dificilmente teria acesso, pode ser feito entre pessoas da mesma crença sem grandes problemas, mas, sendo um dos temas que não trata diretamente dos ensinamentos de Cristo, ele pode facilmente gerar discórdia entre pessoas de diferentes religiões e culturas. Buscando pontos convergentes, ou seja, em comum, com outras religiões, é interessante notar que o apóstolo João cita o termo o Verbo: Isto traz uma vaga semelhança aos textos da gênese da religião do profeta Mani (maniqueísmo), onde o chamado de Deus torna-se uma deidade. Mani propunha uma religião judaico-cristã e sincrética (com o zoroastrismo e o budismo) durante o conturbado ressurgimento do Império Persa (sob a dinastia Sassânida) na Ásia, aproximadamente onde hoje estão o Irã e o Iraque. Entre seus textos ficaram conhecidas as explicações sobre a gênese, anjos caídos e Adão. João também diz que a luz resplandeceu nas trevas, mas esta última não compreendeu e Mani diz que a luz de Deus foi recuperada das trevas que a engolia ou a cercava. Por fim, João admite a Trindade (Pai, filho e Espírito Santo) enquanto Mani cita o Deus Criador, a Mãe da Vida (Espírito Vivo) e o Homem Original. 

Apesar das vagas semelhanças entre diferentes espiritualidades e religiões, não é muito produtivo discutir mais detalhes sobre a trindade, origem e/ ou forma de Deus, de seus anjos e/ ou espíritos, uma vez que os seres humanos, ao invés de olharem para as semelhanças, tendem a olhar para as diferenças e defender suas próprias opiniões, deixando de lado a piedade e alegando inexistências, impondo restrições e atacando uns aos outros devido às interpretações divergentes etc.

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