domingo, 20 de fevereiro de 2022

Imortalidade - Uma pluralidade Existencial?


Finitude ou Continuidade? 

Quando um ser humano morre, tudo acaba? Ou existe "vida após a morte"?

Uma pergunta tão velha quanto andar para frente, mas que já se descobriu a resposta... Ou não: Apenas achamos que descobrimos. 

"Crer em vida após a morte" é um patrimônio da humanidade: Histórias sobre tal assunto existiram em inúmeras civilizações desde tempos imemoráveis - possivelmente desde muitos milênios antes da invenção da escrita nas civilizações mesopotâmicas. 

Os celtas, os antigos gregos, os persas, os mesopotâmicos, os japoneses, os egípcios, os mesoamericanos, os iorubá entre tantas outras culturas falavam de um mundo espiritual, de espíritos, ou de ambos. 

No ocidente, mesmo após a propagação das religiões cristãs, a idéia da imortalidade da alma continuou sendo aceita. Claro que esta aceitação aconteceu com algumas modificações no conceito de espírito e de vida após a morte, possivelmente devido ao uso da religião como ferramenta de poder a partir do último século de existência do Império Romano. 

Esta percepção ou entendimento da alma/ espírito como algo diferente do corpo (o que pode incluir o conceito de imortalidade), começou a ser rechaçada durante o período iluminista na Europa. Com as disputas filosóficas entre materialismo e idealismo numa busca para determinar as bases da ciência (ontológicas e epistemológicas), os estudos dualistas e pluralistas, que admitiam a possibilidade da alma incorpórea, foram perdendo espaço no ocidente. 

Como o idealismo foi encontrando cada vez mais dificuldade em estabelecer-se como uma base filosófica para as ciências, o materialismo foi "sendo entendido como a verdade" já no século 19. As classes intelectuais do ocidente (essencialmente Europa e EUA) então passaram a admitir como verdade apenas a matéria (perceptível pelos 5 sentidos humanos) e nem o espiritismo, também "nascido" na Europa, conseguiu questionar tal corrente de pensamento. 

A partir daí, com o domínio do pensamento racionalista e materialista nas "elites" das nações ocidentais, começou-se a propagar a ideia de que a noção de uma continuidade (da vida após a morte) é algo primitivo e/ou ingênuo com traços de infantilidade ou de mero argumento consolador. Uma generalização reducionista que ignora um enorme número de culturas, cada qual com diversos motivos, variados tipos de fé e diversas explicações sobre a vida espiritual, o pós morte e o além. 

O espiritismo que sobreviveu após o século 19, tornou-se predominantemente dogmático, conservador, mistificado e relegado a uma posição de seita religiosa ou de pseudociência. Embora as principais causas disto seja a recusa de cientistas e até mesmo de filósofos a cogitarem a possibilidade dos elementos psíquicos (alma) transcenderem o cérebro, parte dos próprios espíritas preferiram manter-se em agrupamentos um tanto alienados, desinteressados no progresso mental (intelectual, mas incluindo sentimentos, empatia etc) da humanidade. 

A classe intelectual então tornou-se majoritariamente crente na finitude, ou seja, passou a crer que na morte ocorre o desaparecimento total e repentino de todos elementos que constituem o aparelho psíquico (mente, alma, tanto faz o nome...). Toda a gama de experiências espirituais citadas por diversas culturas na história da humanidade, desde contatos com espíritos desencarnados, passando pelo êxtase espiritual até a vida após a morte, passou a ser considerada fantasia ou charlatanismo. De fato charlatões alegaram vivenciar tais experiências, mas mentirosos existem em todas as áreas do saber, pois também persistem na filosofia e na ciência. 

A percepção de tais fenômenos geralmente é interna, é da mente e não apenas dos 5 sentidos humanos. Talvez daí uma das dificuldades de aceitar a vida após a morte - não se pode percebê-la nem prevê-la. A percepção puramente da mente é tida como uma sensação ou ato de sentir, o que está mais para sentimento, pois não é externo ao ser humano. Isto cria uma interessante ligação do sentimento com a passagem para uma outra existência (a morte e a vida após ela), na verdade possivelmente vincula o sentimento à maioria ou às todas experiências tidas como sobrenaturais ou transcendentais. 

Como a possível existência após a morte não é percebida pelos 5 sentidos humanos, muitos escolhem acreditar que não existe coisa alguma após a morte. De fato, não há métodos investigativos considerados científicos que rastreiem e provam a existência de uma dimensão "espiritual" nem a de "espíritos desencarnados". Talvez tal estado de existência tenha relação com a teoria de múltiplas dimensões ou com a Interpretação dos Muitos Mundos, mas isto ainda é especulação. 

Enfim, fora as "experiências de quase morte" (EQM), a ciência pouco sabe sobre tais assuntos e talvez nem possa saber enquanto for dependente do método empírico para pesquisar. Por isso (ao menos por enquanto) só nos restam respostas filosóficas ou espirituais/ religiosas para estas questões. 

Sócrates sobre a morte e a imortalidade

As histórias sobre vida após a morte não eram novidade na época de Sócrates e de Platão (por volta do século 4 aC). Ela já existia no orfismo, que de certa forma era a religião mística e/ou da elite da Grécia Antiga. Orfeu não é um personagem historicamente comprovável, podendo ser parcialmente real, parcialmente inventado por poetas ou rapsodos, até mesmo mais antigos do que Homero e Hesíodo. 

No livro Fédon, de Platão, o filósofo Sócrates conversa com seus colegas sobre a morte: 

"O fato, Símias e Cebete, prosseguiu, é que se eu não acreditasse, primeiro, que vou para junto de outros deuses, sábios e bons, e, depois, para o lugar de homens falecidos muito melhores do que os daqui, cometeria uma grande erro por não me insurgir contra a morte. Porém podes fiar que espero juntar -me a homens de bem. Sobre esse ponto não me manifesto com muita segurança; mas no que entende com minha transferência para junto de deuses que são excelentes amos: se há o que eu defenda com convicção é precisamente isso. Esse motivo de não me revoltar a idéia da morte. Pelo contrário, tenho esperança de que alguma coisa há para os mortos, e, de acordo com antiga tradição, muito melhor para os bons do que para os maus." 

Neste ponto Sócrates explica que não teme a morte nem se revolta contra esta. Pois ele tem certeza e/ou crê que irá juntar-se aos bons deuses (bons espíritos de acordo com o espiritismo). Ele também fala que tem esperança (no bem e na justiça, além da vida terrena). 

"Que não será senão a separação entre a alma e o corpo? Morrer, então, consistirá em apartar-se da alma o corpo, ficando este reduzido a si mesmo e, por outro lado, em libertar - se do corpo a alma e isolar-se em si mesma? Ou será a morte outra coisa?" 

Sócrates então continua o diálogo com Símias, onde ambos concordam que o verdadeiro filósofo despreza os prazeres do comer, do beber, do amor (ato sexual) e da abundância e luxo das vestimentas. 

"Nisto, por conseguinte, antes de mais nada, é que o filósofo se diferencia dos demais homens: no empenho de retirar quanto possível a alma na companhia do corpo." 

"Essa é a razão, Símias, de, na opinião da maioria dos homens, não merecer viver o indivíduo a quem nada disso é agradável e que não se importa com tais práticas, por achar - se muito mais perto da condição de morto e por não dar a menor importância aos prazeres alcançados por intermédio do corpo"

"E como referência à aquisição do conhecimento? O corpo constitui ou não constitui obstáculo, quando chamado para participar da pesquisa? O que digo é o seguinte: a vista e o ouvido asseguram aos homens alguma verdade? Ou será certo o que os poetas não se cansam de afirmar, que nada vemos nem ouvimos com exatidão? Ora, se esses dois sentidos corpóreos não são nem exatos nem de confiança, que diremos dos demais, em tudo inferiores aos primeiros? 

Não pensas desse modo? 

Perfeitamente, respondeu. 

Então, perguntou, quando é que a alma atinge a verdade? É fora de dúvida que, desde o momento em que tenta investigar algo na companhia do corpo, vê se lograda por ele." 

Sócrates então continua explicando que a alma atinge a verdade com o pensamento. Em introspecção, ao afastar-se dos sentidos humanos, (visão, audição e os outros 3 inferiores) a alma dispensa a companhia do corpo, tornando-se capaz de alcançar a pureza. Assim, o amante da sabedoria e da verdade, ou seja, o verdadeiro filósofo, não teme a morte. 

Interessante notar que Sócrates priorizava as ações mentais: o pensamento para se alcançar a verdade, o acreditar no Bem e a esperança - todos elementos da alma/ mente. Isto completa seus ensinamentos que mostram a mente como algo superior ao corpo e que tudo o que é superior rege o que lhe é inferior, não para oprimir, mas para o bem. Afinal Sócrates não abominava o mundo material, tanto que sugere melhorias para a sociedade como citado em "A República".

Para explicar se há um estado (da alma, espiritual) após a morte, Sócrates segue: 

"Estudemo-lo, pois, sob o seguinte aspecto: se as almas dos mortos se encontram ou não se encontram no Hades? Conforme antiga tradição, que ora me ocorre, as almas lá existentes foram daqui mesmo e para cá deverão voltar, renascendo os mortos." 

"Para deixar a questão mais fácil de entender, observou, não te limites a considerá -la com relação aos homens, porém estende-a ao conjunto dos animais e das plantas, numa palavra, a tudo o que nasce, a fim de vermos se cada coisa não se origina exclusivamente do seu contrário, onde quer que se verifique essa relação, tal como no caso do belo, que tem como contrário o feio, no do justo e do injusto e em mil outro exemplos que se poderiam enumerar." 

"E então? Se alguma coisa piora, é porque antes era melhor, como terá sido antes injusta para poder tornar-se justa? 

Como não? 

E agora? Não é próprio dessa oposição uni versal haver dois processos de nascimento: o que vai de um contrário para o outro, e o de sentido inverso: deste último para aquele?" 

"E então? Prosseguiu: viver não comporta um contrário, tal como se dá com a vigília e o sono? Perfeitamente, respondeu. Qual é? 

Estar morto. Sendo assim, cada um desses estados provém do outro, visto serem contrários, havendo entre ambos um processo recíproco de geração." 

"Que faremos, então? Continuou; não atribuiremos a esse processo de geração o seu contrário, ou admitiremos que nesse ponto a natureza é manca? Não será preciso aceitarmos um processo gerador oposto ao de morrer? 

Sem dúvida nenhuma, respondeu. 

Qual? 

Reviver." (renascer, ou seja, reencarnar) 

Sócrates conclui sobre o processo recíproco de geração dizendo que o viver e morrer é um ciclo e não algo linear. Ele dá os exemplos do processo do sono e do mito de Endimion, onde o protagonista é colocado em um estado de sono eterno. Se o processo de vigília e sono fosse linear, todas pessoas não acordariam mais ao cair no sono, e não haveria necessidade do mito. Outro exemplo é a história contada por Anaxágoras, onde antes da formação do universo havia o estado de confusão total (similar à Khaos, a divindade ancestral de mitos gregos) que acabou dividindo-se e dando origem às estrelas e planetas com seus respectivos movimentos orbitais, ao ser organizada por Nous, a mente cósmica. Se o tempo e o fluxo de espíritos fosse linear, talvez nunca tivéssemos saído do Caos Primordial, ou entraríamos permanentemente nele em certo ponto da história. 

Depois disto Sócrates explica as reminiscências para falar da existência da alma antes do corpo: Se refere a capacidade do ser humano lembrar-se de coisas que ele achava que tinha esquecido definitivamente (similar ao inconsciente da frente psicanalítica de psicologia) e de lembrar-se de coisas anteriores ao seu nascimento (memórias de outra existência anterior). 

Sócrates ainda diz que o vício é o que mais faz mal à alma, mas nem mesmo ele pode destruí-la. 

Por fim, no livro a República, Platão registra o mito de Er contado por Sócrates. Por mais que alguns mitos tentem ensinar lições às pessoas da antiguidade, este em particular, descreve detalhadamente uma passagem da vida espiritual, ou seja, desencarnada, do personagem Er. 

Jesus Cristo sobre a Imortalidade da Alma 

Em variados trechos dos evangelhos, Jesus menciona a importância de priorizar a vida espiritual ao invés da vida material, indicando que há continuidade da existência após a morte. A valorização da vida espiritual não significa que deva-se abandonar a vida terrena, e sim que esta existe para se aprender a fazer o bem, para amar à Deus, e portanto, amar à todos. Seguem os trechos onde Jesus indica a existência da imortalidade da alma: 

"Não ajunteis para vós tesouros na terra... Ajuntai para vós tesouros no céu... Porque, onde está teu tesouro, lá está também seu coração." 

 "Ninguém pode servir a dois senhores, porque, ou odiará a um e amará a outro, ou dedicar-se á um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e à riqueza. Portanto, eis que vos digo: Não vos preocupeis por vossa vida, pelo que comereis, nem por vosso corpo, como vos vestireis. A vida não é mais do que o alimento e o corpo não é mais que as vestes? 

...Não vos aflijais, nem digais: Que comeremos? Que beberemos? Com que nos vestiremos? São os pagãos que se preocupam com tudo isso. Ora, vosso Pai celeste sabe que necessitais de tudo isto. Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça e todas essas coisas vos serão dadas em acréscimo. Não vos preocupeis, pois, com o dia de amanhã: o dia de amanhã terá suas próprias preocupações. A cada dia basta o seu cuidado." 

 "Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem matar a alma; Temei antes aquele que pode precipitar a alma e o corpo na gehena." 

"Quando o espírito impuro sai de um homem, ei-lo errante por lugares áridos à procura de um repouso e não acha." 

"Em verdades vos digo, se não transformardes e vos tornardes como criancinhas, não entrarei no reino dos céus. Aquele que se fizer humilde como esta criança será maior nos reinos dos céus." 

"Lá se transfigurou na presença deles: seu rosto brilhou como o Sol, suas vestes tornaram-se resplandecentes de brancura. E eis que apareceram Moisés e Elias conversando com ele..." 

..."Em seguida, os discípulos o interrogaram; Porque dizem os escribas que Elias deve voltar primeiro? Jesus respondeu-lhes: Elias de fato, deve voltar e restabelecer todas as coisas. Mas eu vos digo que Elias já veio, mas não o conheceram;" Este trecho parece falar da reencarnação. 

"O reino dos céus é semelhante ainda a uma rede que é jogada ao mar, recolhe peixes de toda espécie. Quando está repleta, os pescadores puxam-na para a praia, sentam-se e separam nos cestos o que é bom e jogam fora o que não presta." 

"E todo aquele que deixar irmãos, irmãs, pai, mãe, mulher, filhos, terras ou casa, receberá o cêntuplo e possuíra a vida eterna." 

A Convergência dos Ensinamentos da Espiritualidade Ocidental

No século 19, o linguista e professor francês, Hippolyte Leon D Rivail, se interessa sobre o assunto dos fenômenos tidos como "sobrenaturais". Após algumas experiências, ele assumiu o nome de Allan Kardec, alegadamente de um druida da antiga cultura celta. 

Suas obras reúnem diversas doutrinas que levam em consideração a existência espiritual, ou seja, da vida após a morte. Apesar dos antigos (druidas) celtas considerarem a existência espiritual, as obras de Kardec se baseiam em Sócrates, Platão e principalmente, Jesus Cristo. Isto possivelmente ocorre pelo tema central destes ensinamentos: o Bem, a verdade e o amor. 

Estudos sobre a Alma e a Espiritualidade - Ontologia e Epistemologia

Kardec admite que sua obra é uma filosofia, mas também um conjunto de estudos e uma doutrina (baseada em Cristo e em Sócrates - A busca pelo bem é o que há em comum entre estes autores). Seus estudos admitiam uma base existencial aparentemente dualista de corpo e espírito (apesar da existência do períspirito como um campo intermediário entre corpo e espírito). Esta estrutura ou "campo" quase imperceptível aparece em filosofias e religiões orientais com diversos outros nomes e "formas". Mas se levarmos em conta, além do perispírito, a possibilidade de depuração do espírito, que em seu progresso durante sua existência imortal, vai se tornando mais "etéreo" ou mais sutil, possivelmente o espiritismo teria uma ontologia pluralista. 

Em relação ao método de investigação, claramente o espiritismo não pode nem deve se apoiar no empirismo, que se trata de um método muito mais apropriado para estudos materialistas, ou seja, que lidam apenas com a matéria perceptível pelos 5 sentidos humanos e que podem ser reproduzidos (repetidos) à vontade. Como os estudos espíritas muitas vezes lidam com inteligências (ou mentes) que aparentemente "surgem e desaparecem", é ilógico utilizar o método empírico para tentar provar ou negar a maioria dos fenômenos espirituais. 

Kardec ressalta a importância da ausência de pressupostos (ideias, julgamentos, escolhas) para se estudar fenômenos espirituais (tal ausência seria a base da fenomenologia poucas décadas mais tarde). 

A mente não é algo que se reduz a estudos naturalistas ou materialistas: Ela é subjetiva e formada por processos internos não observáveis a partir do exterior, ou seja, por terceiros. 

A partir destas bases, Kardec e seus colaboradores, confiam principalmente na sua percepção mental (talvez levando em conta interpretação, intuição etc) dos fenômenos e desenvolvem teorias e métodos que obviamente levam em consideração a transcendência da alma, seja a imortalidade, o contato com o "além", como o êxtase espiritual, o desdobramento etc. 

Por fim, a imortalidade da alma no espiritismo é o que explica algumas aparentes injustiças na Terra, as lembranças "misteriosas" que não pertencem à vida atual do ser, as recompensas e punições mencionadas por Sócrates e Jesus Cristo etc. Nenhum destes fenômenos tira a importância central de se amar à todos (à Deus, a si e ao próximo) nem da busca pela sabedoria: Pelo contrário, tudo gradativamente indica que este é o caminho do verdadeiro progresso de toda a existência.  

 Fontes:

Platão. Versão eletrônica do diálogo platônico “Fédon”, Tradução: Carlos Alberto Nunes Créditos da digitalização: Membros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia)

Tradução dos Originais mediante a versão dos Monges de Maredsous (Bélgica). Bíblia Sagrada 83 edição, Editora Ave Maria. 

Kardec, Allan.; O Que É o Espiritismo? https://kardecpedia.com/roteiro-de-estudos/885/o-que-e-o-espiritismo; acesso em 02/02/2022.

 

 

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Espiritualidade e as possíveis Dimensões

 

Muitas religiões nos contam que Deus criou tudo. Com diferentes nomes e/ou formas, esta explicação é comum. Obviamente isto não é bem aceito na ciência objetiva. Céticos perguntariam, como Deus fez tudo? Como era esse ser? Como ele pensava? 

Comecemos imaginar vagamente dentro de nossas limitadas condições o seguinte: A questão da criação do universo sempre remete a dúvida se havia um começo ou se o tempo infinito é de alguma forma cíclico não havendo de fato começo-meio-e-fim, ou seja, não havendo uma linearidade. A verdade é que o processo de "surgimento" do universo não foi aleatório, pois se fosse assim, não haveria harmonia, nem movimentos organizados entre os corpos celestes etc. Não houve uma explosão como entendemos hoje, tanto que existe o termo expansão cósmica para diferenciar esse processo. O "surgimento" do universo também não foi obra do acaso, pois acaso significa que não houve causa, portanto o acaso não produz coisa alguma. 

Mas para imaginar uma inteligência (ou de modo mais preciso: uma mente), capaz de desafiar o conceito de tempo que o ser humano conhece ou consegue entender, seria preciso deixar de lado a simplória discussão se houve começo ou não: Hoje, no século 21 sabemos que certos fenômenos causam distorção no espaço-tempo. Oras, se existe tal distorção, esta distorção ocorre em sentido a uma direção ou em relação a um momento ou conjunto destes elementos. Se tal fenômeno existe, então há algo além do que entendemos como o tempo (e, de certa forma, toda sua eternidade) e o espaço (e, de certa forma, toda sua infinitude). Sim, parece muita coisa, de dar um nó na cabeça, mas é assim mesmo. Daí o termo "além" ou "do além". 

Se há uma "direção" além da tridimensionalidade da nossa "realidade" ou além do espaço-tempo continuum, ela deve ter relação com o conceito da quarta dimensão abordado num vídeo do famoso divulgador científico Carl Sagan. 

Daí é possível ter uma impressão (ainda que vaga) de quão grandioso pode ser o universo, ou o conjunto das possíveis dimensões. Se há uma quarta dimensão pode haver outras. A existência de vida, ou de mentes nestas dimensões "além" desta nossa realidade em 3 dimensões, ainda que quase inimaginável, marcaria uma transitoriedade entre Deus e toda sua criação, incluindo o processo chamado de Big Bang ou Expansão Cósmica. 

Um ser da quarta dimensão poderia existir em um estado muito mais sutil e puro do que a típica vida conhecida na Terra. Daí podemos ver alguma conexão destes seres com as experiências espirituais/ religiosas, de êxtase e afins. 

Além do quarto estado da matéria, a "energia" é naturalmente luminosa e/ou brilhante, sendo mais pura, mais expansiva, mostrando uma relação com uma "direção" só compreensível e existente na quarta dimensão. Nesta dimensão, os seres (chame de mentes, espíritos ou anjos) podem perceber e interagir além da porção do espaço-tempo que percebemos e interagimos aqui na Terra. Daí porque podem ouvir pensamentos, perceber sentimentos, intenções, orações e "sumir e aparecer". Este estado de existência seria literalmente mais extensivo e talvez expansivo. Estaria mais conectado a mais coisas do que podemos perceber aqui na Terra. A terra e "seu espaço 3D" estaria muito distante das dimensões mais elevadas, mais próximas de Deus, do Criador. É uma realidade literalmente muito mais pesada, pois é muito mais densa. A matéria aqui existem em estados que não são típicos das dimensões mais elevadas. Forças como contração e cisão/ divisão são mais comuns nas dimensões menos elevadas e assim, são comuns aqui na Galáxia onde o Sistema Solar e a Terra se encontram. 

Utilizando-se da teoria das 7 dimensões possivelmente oriunda de religiões e/ou filosofias orientais, imaginemos que o "reino" de Deus seja a sétima dimensão. Certamente isto pode parecer inimaginável, mas seria uma dimensão onde conecta-se todas as coisas. Tempo aqui é uma fração da realidade, talvez um sétimo ou menos. Algo que se pode atravessar ou por onde seja possível espalhar-se. Apego aos bens materiais da terceira dimensão aqui é impossível, pois é algo muito ínfimo, minúsculo como se fosse microscópico. Então teríamos mais 3 dimensões entre Deus e a Terra. Cada uma delas no mínimo tão grande (ou infinita) como o espaço onde se encontra a Via-Láctea e seus pequeninos e vários sistemas estelares da "nossa realidade tridimensional". A partir deste resumo podemos tentar entender melhor o que obras religiosas, filosóficas e mitológicas tentavam explicar em algumas de suas passagens. Platão afirma que os deuses sentiram o peso da matéria ao reinarem na Atlântida por um período prolongado e acabaram se corrompendo. Os gregos utilizavam o nome Aether para se referir a uma divindade que representava o céu além do céu de Urano, pai dos titãs e avô de Zeus. O aether às vezes era descrito como um céu luminoso e/ou uma luminosidade que não aquecia ou não queimava como o fogo. Possivelmente Aristóteles tirou o conceito de Éter daí (Ether). Forças muito sutis, também chamadas de muito puras ou muito eterizadas, poderiam ser oriundas da dimensão diretamente superior a que vivemos (a quarta) por exemplo. Nesta escala, estaríamos à 4 dimensões de distância do "mais elevado céu" (Claro, poderíamos utilizar outra escala, mas não vou entrar na possibilidade de estarmos na dimensão, ou na dimensão "zero", que deve estar mais próxima do conceito de 7 céus de algumas religiões). 

Enfim, nada disso deve nos desanimar. Sermos pequeninos, ou estarmos distantes da pureza maior/ mais verdadeira não nos impede de fazer coisas boas. Pelo contrário humildade é um bom começo.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

As Margens entre Ciências Humanas/Biológicas e Misticismo

 

Falar de crenças ainda é um tabu no meio acadêmico/ científico. A psicologia que, em partes, deveria estudar seus efeitos e causas, está dividida. Tal divisão é profunda e é similar à que ocorre com alguns outros campos da ciência também. 

Em outro texto ( https://nea-ekklesia.blogspot.com/2021/07/a-alma-um-tema-talvez-inconclusivo-mas.html ) mencionei um médico, que ao observar pacientes que passaram por EQM, teorizou que a “consciência” existe além do cérebro. Uma "afronta" aos materialistas/ empiristas, feita por alguém que basicamente estudou uma ciência alicerçada sobre o método empírico: A medicina. Por um outro lado, a Organização Mundial da Saúde já admite que a espiritualidade tem sua importância na saúde mental de muitas pessoas. O Consciente/ a Consciência e as Crenças As crenças, se levadas a sério, têm sua influência não necessariamente na consciência - muitas vezes elas ficam no subconsciente (ou inconsciente) até serem resgatadas pela consciência. Obviamente toda informação em nossa mente/ aparelho psíquico, seja uma memória, um sentimento ou mesmo uma interpretação, não deixam de existir em momento algum: Elas apenas ficam inativas ou fora da percepção da consciência por determinados períodos (afinal, deixar de existir para voltar a existir depois de algum tempo, não é muito científico). Isto é claro nos estudos psicológicos da frente psicanalítica, sejam estudos de Freud, de Jung ou de outro estudioso desta área. Uma crença levada a sério é “um acreditar”, podendo ser considerada uma “certeza” da pessoa que acredita. 

Na frente fenomenológica da psicologia, esta crença faz parte da realidade do indivíduo. Afinal, para se estudar uma pessoa em particular (paciente, cliente etc), deve-se não só evitar preconceitos, como também suspender bases teóricas generalistas, que às vezes, por não levar em consideração os fatos particulares de cada pessoa, acabam colaborando para diagnósticos errados. Nestas abordagens fenomenológicas a consciência é uma atividade direcionada, sempre sendo uma consciência de algo, o que as aproximam da teoria geral dos sistemas. Sendo assim, a consciência do psicoterapeuta trabalha desvelando os “acidentes” (de certo modo, os fatos históricos constituintes do objeto/ ser) para chegar à essência do "objeto" (paciente etc). Então, mesmo com as diferenças entre psicanálise e fenomenologia, pode-se notar que a consciência (o consciente) é um elemento ativo do aparelho psíquico. Em ambas bases de estudo (quer você considere científicas ou não) a consciência não tem substância perceptível pelos 5 sentidos humanos, mas lida com informações captadas pelos sentidos e com intenções e elementos mais “profundos” de nossas mentes, sendo que estes últimos a frente psicanalítica posiciona no inconsciente. 

Voltando à pessoa que crê em algo, o seu interesse e/ou a sua fascinação são “aberturas” na mente que podem ser consideradas vulnerabilidades. Isto ocorre porque, em um relacionamento com outro indivíduo por exemplo, o interesse e a fascinação permitem a criação de um elo ou empatia com uma “pessoa”. Se esta pessoa for mal intencionada ela pode usar desta abertura psíquica para “atacar” o indivíduo fascinado ou vulnerável. Este ataque não é necessariamente algo destrutivo, podendo ser uma influência que se transmite pelo inconsciente. Uma manipulação emocional já pode ser considerada como uma influência mais naturalmente perceptível. 

Esta influência é “tratada” pela hipnose e por diversos meios chamados de mágicos, místicos e afins. Nestes últimos meios ela é frequentemente considerada um ataque astral. 

 

Das Teorias Místicas até as Científicas 

Ataques astrais podem ser feitos à distância quando o atacante tem um objeto do alvo em posse. Este tipo de ataque é mais difícil de ser realizado e recebe vários outros nomes genéricos pouco precisos, desde magia negra até vudu… 

Não estar com a mente, ou talvez mais precisamente, o inconsciente, aberto, é uma maneira efetiva de defesa contra influências nocivas (ou ataques astrais). Tranquilidade, estabilidade e fé são meios de defesa contra ataques astrais. Certamente estados de depressão e ansiedade são estados de vulnerabilidade, pois estão relacionados a vazios (literais) afetivos/ existenciais. 

É óbvio que céticos materialistas abominam estes fatos, geralmente negando-os pelo fato de praticamente não poderem ser detectados no espaço-tempo conhecido, como por exemplo, na atmosfera ou nos corpos humanos. 

Há teorias que afirmam que sentimentos e interações como essas afetam muito sutilmente os campos eletromagnéticos (não estou falando necessariamente de Kardec aqui, temos estudos muito mais recentes feitos pelo Heartmath Institute Research Center e por outros cientistas)… Isto deve explicar porque é mais fácil realizar ataques próximos, pois nestes casos os corpos ou cérebros devem manifestar algum tipo de campo sutil, ainda pouco conhecido na atualidade. 

Note que sofrimentos psíquicos, dos quais os leigos chamam de momento difícil, podem gerar vulnerabilidades. Todo sentimento negativo acaba se relacionando com algum tipo de sofrimento e pode eventualmente constituir psicopatologias ou comportamentos doentios. O termo doentio é usado aqui para definir nocivo - algo que propaga sofrimento, dificuldades e, em alguns casos mais extremos, doença e morte. 

 De acordo com teorias místicas, cascas astrais são formas residuais relacionadas aos corpos astrais (talvez às almas desencarnadas também). Ao atingir outros níveis de consciência (ou acessar planos superiores também?), a casca astral pode se dissolver ou permanecer algum “tempo” no plano astral, servindo para mentes (inconscientes ou espíritos) encarnadas ou desencarnadas. Esta casca pode ser habitada por elementais ou por vontades e desejos naquele nível de “consciência” (que a casca ficou). Sejam mentes ou espíritos, eles são apegados à vida terrestre e tendem a buscar “energias” como parasitas. 

Praticamente todos esses elementos são discutidos apenas entre místicos porque lidam com o “imaterial” ou incorpóreo. Porém eles também trabalham os sentimentos e o inconsciente, ocasionalmente chamado de subconsciente. Como mencionado anteriormente, de acordo com alguns métodos utilizados na psicologia, a consciência funciona como uma projeção de luz, ou talvez como um olhar. Ela é constituída de elementos como o direcionamento da atenção, da intencionalidade. Tais elementos interagem de maneira cíclica com o meio ambiente e com a própria mente: às vezes por ação, às vezes por reação. 

Este ciclo se estende até variadas "profundidades" do aparelho psíquico, atingindo o que as abordagens psicanalíticas chamam de inconsciente. Portanto afetam o sentimento também. Por fim, estas relações dos elementos do aparelho psíquico também interagem com o respectivo corpo. Assim, podemos considerar relações: 

Psíquica-psíquica: Da mente consigo mesma (ao pensar, lembrar) ou com outra mente (ao influenciar uma ou mais pessoas); 

Psíquica-corporal: Da mente com o próprio corpo (fatores psicossomáticos); 

Psíquica-social: Da mente com ambiente externo (interpretações de diversos elementos do ambiente etc); 

Psíquica-espiritual: Da mente com elementos pouco estudados e compreendidos, que geralmente passam pelo inconsciente (experiências transcendentais, visões e afins). Este último ainda é pouco aceito nas ciências do século XXI, mas alguns órgãos como a OMS (já mencionada anteriormente) já admite a importância da espiritualidade/ religiosidade na saúde de algumas pessoas. 

Nas teorias místicas, chakras e sefirots estão muito ligados aos sentimentos (emoções não necessariamente manifestadas no mundo físico). Eles relacionam-se com o aparelho psíquico e com o corpo físico, sendo que o aparelho psíquico existe no corpo astral, ou é sinônimo deste. Obviamente estas teorias não têm embasamento científico, mesmo porque são mais antigas do que o iluminismo europeu, e portanto, mais antigas do que chamamos de ciência. Mas mesmo nas ciências atuais, temos alguns estudos tímidos (por falta de transdisciplinaridade) sobre as relações do cérebro com outros pontos do corpo, seja com o sistema cardiovascular ou com o endócrino. (vide os estudos do Instituto Heartmath e de Srini Pillay, professor de psiquiatria da escola médica de Harvard) 

Nas teorias mais espiritualistas/ místicas, os sofrimentos podem atrair espíritos que buscam energias. Sofrimentos superficiais mas persistentes ou ampliados por desejos individualistas, egoístas, inveja e sentimentos similares podem ser destrutivos também “nestas teorias” e não apenas na psicologia cardíaca. 

Pensamentos e sentimentos, como praticamente tudo, depende de algum nível de relação. Sendo assim, podemos considerar uma pessoa demonstrando raiva, geralmente não atrai uma pessoa alegre. Atraímos o que pensamos, mas imaginar que só somos felizes com algumas determinadas coisas não atrai tal coisa. Isto ocorre porque há uma "infelicidade'' no caminho, por exemplo: “Só serei feliz quando tiver uma determinada casa”. Esta afirmação não só impõe uma condição, ela está centrada nesta condição que não é uma realidade naquele momento e que está obstruindo a felicidade. Ela também não afirma que a pessoa terá a casa, ela afirma que a felicidade só será alcançada SE aquela condição for satisfeita. A afirmação atira para o futuro, e por si só, jamais traz para o presente a “tão desejada condição”. Nas abordagens fenomenológicas da psicologia, esta condição certamente é nociva ao paciente/ cliente: É o que ele escolhe fazer com seu respectivo desejo ou dificuldade. 

*texto originalmente publicado em agosto de 2021, no blog Nea Ekklesia

Leitura ecumênica de "as boas obras", "a oração" e "o amigo insistente"

Aqui continuo com os ensinamentos de Jesus, conforme os textos atribuídos a Mateus e a Lucas:  Fazer as boas obras discretamente (Mateus, Lu...