quarta-feira, 10 de abril de 2024

Leitura Ecumênica da Cura de um Leproso

Cura de um Leproso (Mateus, Marcos, Lucas) 

"Aproximou-se dele um leproso que, rogando-lhe, e pondo-se de joelhos diante dele, lhe dizia: Se queres, bem podes limpar-me. 

Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão, e tocou-o, e disse-lhe: Quero, sê limpo. Tendo ele dito isto, logo a lepra desapareceu, e ficou limpo. 

E, advertindo-o severamente, logo o despediu dizendo-lhe: Olha, não digas nada a ninguém; porém vai, mostra-te ao sacerdote, e oferece pela tua purificação o que Moisés determinou, para lhes servir de testemunho. 

Mas, tendo ele saído, começou a apregoar muitas coisas, e a divulgar o que acontecera; de sorte que Jesus já não podia entrar publicamente na cidade, mas conservava-se fora em lugares desertos; e de todas as partes iam ter com ele."

 Independentemente da história/ do passado do homem leproso, Jesus aceita e quer que ele seja curado. Faz isto espontaneamente, sem julgar e pede para que o homem não espalhe sobre como foi curado. Mesmo assim, este leproso curado, como outros personagens curados por Jesus, não segue sua recomendação e espalha a notícia. 

Referente ao pedido que Jesus faz ao curado, de ir ao templo fazer o que Moisés determinou, possivelmente tem relação ao fato de que os judeus ofereciam sacrifícios quando recebiam "milagres" como a cura de uma doença como a lepra. Estes sacrifícios geralmente eram a oferta de animais, em uma espécie de gratidão e humildade perante Deus. Porém Jesus também diz que esta cura deveria servir de testemunho, ou seja, uma prova de que Deus estava enviando sua nova mensagem/ palavra à humanidade: Os ensinamentos de Cristo, que são baseados no amor. 

Estas modificações, ou renovações, das práticas religiosas/ espirituais ocorreram e devem ocorrer de tempos em tempos na história da humanidade. Na "Grécia Clássica" por exemplo (4 séculos antes de Cristo), Sócrates revolucionava a espiritualidade em um momento onde a religião grega estava numa certa crise: Os filósofos naturalistas gregos (pré-socráticos) questionaram muitos dos mitos sobre os deuses e semi-deuses, oferecendo explicações naturalistas para diversos fenômenos entendidos como divinos até então. Apesar do potencial para extinguir superstições, o movimento dos "pré-socráticos" estava abrindo espaço para o sofismo alguns anos antes de Sócrates iniciar suas atividades. O sofismo era um movimento relativista que alegava a inexistência do bem e do mal, fomentando discursos manipuladores e a busca por ganhos materiais pessoais. Sócrates então, de certa forma oferece uma restauração da espiritualidade/ religiosidade em crise, e traz a importância da ética (e da virtude) nas relações e na prática da vida pública e em sociedade. Por esta razão Sócrates e seu pupilo Platão, agem principalmente entre as altas classes sociais, tentando propagar a ética e combater o egoísmo e a boataria.

As modificações trazidas por Jesus, por sua vez, indicam a importância dos bons sentimentos, além das virtudes: o amor, a piedade, o não-julgar etc.

Séculos mais tarde, Allan Kardec (e seus colegas médiuns, espíritos etc), indicou a importância da ética cristã e platônica junto à busca pelo entendimento do ser humano e da realidade. Kardec fez isto durante uma época onde de um lado tínhamos um materialismo niilista extremista, típico das elites intelectuais e econômicas e, do outro lado, uma série de fenômenos inexplicáveis até então, que atraíam muitos deslumbrados e místicos charlatães. Esta época foi o século 19 e os movimentos anti-espiritualistas, ou seja, o materialismo, o niilismo e suas vertentes como o biologismo, descambaram em movimentos cada vez mais insensíveis, elitistas e racistas, como o darwinismo social. O darwinismo social, por sua vez, foi uma série de argumentos biologistas de teor elitista e racista que incitou a invasão e partilha da África pelos poderosos da Europa por volta da última década do século 19; Além de fomentar uma altíssima desigualdade social no ocidente durante as três primeiras décadas do século 20; 

Movimentos biologistas como o Darwinismo Social eram naturalmente materialistas/ niilistas e contrários não só ao espiritismo, mas contrários a toda espiritualidade. A defesa do comportamento animal ("a sobrevivência do mais adaptado ou do mais forte") é uma incitação ao uso do poder bélico e do poder econômico para oprimir ou matar o próximo em defesa de interesses particulares e insensíveis. Tal individualismo é contrário à doutrina cristã ensinada por Jesus e contrária ao argumento de Sócrates e Platão que diziam que a lei natural é a mesma dos homens, no sentido que a natureza não aniquila a vida, assim como o homem não deveria destruir o seu semelhante (no diálogo Górgias). 

Por fim, pouco após o espiritismo, surge o movimento da Kriya Yoga na Índia, indicando a possibilidade e a importância da fraternidade entre todos seres humanos, todas as culturas e todas as religiões/ espiritualidades. Sri Yukteswar traça as convergências entre hinduísmo e cristianismo, enquanto seu pupilo, Paramahansa Yogananda, leva sua mensagem ecumênica ao ocidente entre a 2ª e a 4ª década do século 20.

Por coincidência ou não, em oposição a isto, influenciado pelo biologismo racista/ elitista, surge o nazismo na Alemanha que estava em crise econômica/ social. O nazismo, para quem não sabe, foi um movimento eugenista/ nacionalista que pregava a "superioridade da raça pura" germânica que ganhou força entre a terceira e a quarta década do século 20. Esta ideologia, aliada ao punitivismo nacionalista (o fascismo), desembocaram na 2ª guerra mundial.

A mensagem de Sócrates, de Platão, de Jesus, de Kardec, de Yukteswar e de Yogananda têm vários pontos em comum entre si, mas destacam a importância de uma coisa em comum: A esperança. Quando se nega a esperança, sobra alguma coisa? A história da humanidade mostra que não, pois a esperança não só faz parte do sentimento humano, como nos move para além de nós mesmos, podendo ser entendida como transcendente no sentido social e no sentido espiritual.


 

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