segunda-feira, 10 de junho de 2024

Leitura Interreligiosa: Renovação da Lei por Jesus e a Reconciliação

Nesta postagem trago as falas de Jesus de acordo com "textos de Mateus e de Lucas", dividido em duas partes: 

A Nova Lei comparada à Antiga (Mateus) 

"Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim abrogar (abolir), mas cumprir (levá-los à perfeição). 

Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da lei, sem que tudo seja cumprido. 

Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos céus. 

Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. 

Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo. 

Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo; e qualquer que disser a seu irmão: Raca (idiota ou insignificante), será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno."

Pode parecer estranho Jesus dizer que não veio abolir as leis do judaísmo, sendo que ele criticou várias seitas (fariseus, escribas, saduceus) desta religião em seu tempo. Mas na verdade, Jesus fala em levar à perfeição, daí entende-se que os ensinamentos de Cristo são um desenvolvimento do monoteísmo típico do judaísmo e não um mero complemento nem algo que simplesmente se mistura com as leis anteriores. Sem Jesus, a religião cairia no clubismo, na rivalidade, no discurso de “nós e eles”. A grosso modo, o que acontecia com as religiões era o seguinte: Quanto mais antigos os profetas, mais adaptados a uma humanidade bruta e ignorante, eram seus ensinamentos. 

Ainda que a religião cristã tenha se dividido gradualmente em várias igrejas e diversos cultos após a morte de Jesus, é simples entender que tal separatividade religiosa seria ainda maior sem seus ensinamentos. Pois antes de suas pregações, além de existirem diferentes “mitologias” com variados cultos dedicados a “deuses” bem diversos entre si, a religião monoteísta abraâmica (o judaísmo) já estava dividida em diferentes seitas (fariseus, escribas, essênios etc). 

Jesus aperfeiçoa a lei de não matar, dizendo para não se deixarem cair na cólera nem ofenderem o próximo. Afinal as agressões se iniciam no desejo das pessoas e podem ser planejadas antes de serem realizadas. Cortar o mal da violência pela raiz, é esforçar-se para ignorar ofensas e não julgar o outro nem em pensamento, pois é daí que surge o preconceito. Não se trata de reprimir pensamentos ou sentimentos e sim de prestar atenção nas próprias intenções e ideias, para depois avaliar a si mesmo e transformar-se, pois progresso não ocorre apenas pelo nosso aspecto racional: também acontece pelo sentimental/ empático. 

Outro ponto que poderia causar polêmica é o fato de Jesus dizendo que alguém será réu no fogo do inferno. Isto parece em contradição com que Jesus diz à Nicodemos que Deus não julga: é o pecador que não vai à luz devido à vergonha pelas obras más que fez. 

Porém, lembrando que o tema central do ensinamento de Jesus é o amor piedoso, é possível interpretar a passagem corretamente sem que esta contradiga outras: "Fogo do inferno" então é, na melhor das hipóteses, um sofrimento intenso pós vida terrestre/ após a alma deixar o corpo. A alma pecadora não suporta a pureza e bondade da luz de Jesus ou de Deus, e "foge para as trevas". Afastada de Deus e da fulgurante luz da justiça, da temperança, do amor, enfim do bem, a alma tomada por sentimentos negativos após ver a verdade e não conseguir mais esconder seus feitos e pensamentos de si mesma, "queima no fogo do inferno" - É julgada por si mesma devido às obras egoístas que fez durante sua vida na Terra/ sua encarnação anterior. Os sentimentos negativos que "queimam" a alma podem ser os mais diversos: pode ser inveja ao ver alguém que ela odeia "na luz" de Deus, de Jesus ou dos "anjos", pode ser um orgulho persistente que a isola no pós vida, pode ser rancor, vergonha etc. Isto está em acordo com o espiritismo, o platonismo e o hinduísmo (e certamente com outras religiões e espiritualidades como o druidismo celta, religiões relacionadas à cultura yorubá etc).

Reconciliação (Mateus, Lucas) 

"Dizia ele à multidão: "Quando vocês veem uma nuvem se levantando no ocidente, logo dizem: 'Vai chover', e assim acontece. 

E quando sopra o vento sul, vocês dizem: 'Vai fazer calor', e assim ocorre. 

Hipócritas! Vocês sabem interpretar o aspecto da terra e do céu. Como não sabem interpretar o tempo presente? 

Por que vocês não julgam por si mesmos o que é justo? 

Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, Deixa ali diante do altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão e, depois, vem e apresenta a tua oferta. 

Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele (rumo ao magistrado), para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial, e te encerrem na prisão. 

Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil (centavo)."

Não basta ter conhecimento objetivo/ material, como por exemplo entender os fenômenos climáticos: é preciso entender as necessidades humanas como a receptividade e a equidade para possibilitar o convívio pacífico e justo. Este progresso no convívio entre os seres humanos é social e também auxilia o progresso espiritual. Assim, é necessário que as pessoas se conciliem (fiquem em paz) entre si antes de realizarem práticas religiosas (culto, orações etc). Jesus mostra a importância de se respeitar o próximo, a vida e o todo, pois ensina que o bem se manifesta com devoção e amizade. Não basta buscar justiça ou retidão: as pessoas precisam ser piedosas e solidárias. Quem verdadeiramente crê em Deus e/ou na divina lei de amor, não guarda mágoas, não busca condenar o próximo e nem cria rixas. Deixar as inimizades e/ou as disputas persistirem pela vida é algo que custa até mesmo após a vida na Terra. 

A filosofia ocidental, fundada por Platão, aberta à dimensão espiritual, também indica a importância superior da justiça e do bem: Quando questionado se não tinha medo de morrer, Sócrates disse que estava em paz consigo mesmo e com as leis de Atenas, a sua cidade. Sócrates não tentou se vingar de seus acusadores interesseiros e ardilosos nem tentou fugir de seu julgamento; ele nunca desrespeitou as leis por entender que elas eram suficientemente boas para si e para seus compatriotas e sempre buscou a sabedoria, a verdade e o bem. Não se trata de uma questão de mera obediência às leis e sim da prática e busca da virtude/ da ideia do bem. Isso tranquilizava Sócrates, pois ele sabia que havendo algo após a morte, o novo estado de existência estaria de acordo com que ele pensava, sentia e praticava. 

 

 

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